Se ouço canções que ouvia no passado, lembro claramente: do momento. do lugar. do clima. a iluminação, o cheiro, a sensação por dentro e por fora de como era existir durante a última vez que ouvi essa música. A nostalgia é sensível e desesperadora.
Parece que foi um salto de lá para cá e eu não imaginava que seria assim — da última vez que ouvi essa música, a vida não era assim. Há dias em que o passado me aborda, ambulante, e eu só tento seguir em frente — desculpe estou com pressa, não posso fazer nada por você. Me dói deixá-lo assim.
Ouço essas canções como se carregasse sentimentos incoerentes e os levasse de um momento para outro, de um lugar (que sequer existe) para outro (que é o único que tenho).
Sei bem que essas sensações não existem. Existiram e eram eu e agora se perderam no amontoado de coisas que fiz de mim. É estranho ainda poder ouví-las por baixo de todas as camadas, cada vez mais abafadas e inconvenientes.
Às vezes sinto asco, como se tivesse sido tocada sem permissão. O passado parece querer sugar de mim alguém que não está mais aqui e, ao me procurar, me devora, de dentro para fora.
