Padaria Santa Tereza
Uma vez, ainda em São Paulo, precisei ir ao Fórum João Mendes no final da tarde questionar coisas a algum cartorário. Trata-se de um prédio de 1757, antigo, público e verticalizado, como a maioria dos prédios do centro histórico da cidade. Ele possui vários elevadores que não alcançam todos os andares, então é preciso estar atento às orientações e ter paciência.
Enquanto descia do décimo segundo andar até o térreo, o elevador parou no oitavo para buscar meu professor de processo civil – que também é advogado, e recentemente se tornou professor titular do departamento – junto do que imaginei ser seu cliente. Ambos entraram entusiasmados, conversando sobre uma audiência que, suponho, tinha acabado de acontecer. Sequer tive coragem de interrompê-los com um possível “boa tarde, professor” e fiquei apenas os observando enquanto não chegávamos no último piso.
Em dado momento, ainda no elevador, o assunto cessou. Eles passaram a mexer em seus respectivos celulares em breve silêncio, até que meu professor olhou o homem de canto de olho e perguntou, sorrindo, “cafézinho Santa Tereza?”. O cliente assentiu com a cabeça, sem falar nada, mas com uma expressão de quem diz “é claro! É exatamente o que eu preciso!”.
Instantaneamente fui acometida por uma intensa vontade ir também à Padaria Santa Tereza e tomar um café – o que poderia ser estranho já que não fui convidada, então deixei esse desejo para outro dia.
A Padaria Santa Tereza é mais antiga do Brasil, de 1872, e fica ao lado do Fórum João Mendes desde os anos 40 (ou seja, os cartorários esperaram algumas décadas por esse cafezinho). Por dentro ela é cinza e sem muitas firulas; na calçada da frente há uma floricultura, e no andar de cima, um restaurante de faixada amarela, revestido de móveis de madeira escura. É famosa pela idade, pelas coxas-creme e por ser a desculpa perfeita para a pausa dos advogados e servidores públicos que inevitavelmente circulam pelo centro.
Fui naquela mesma semana matar essa vontade, que nunca morre, de dar um tempinho. No final da tarde, pouco antes de ir para a faculdade, sentei naquelas típicas banquetas circulares, para comer no balcão que rodeia a chapa e a cafeteira. Na verdade, devo ter feito isso tantas vezes que a memória se confunde e guardo esse ritual como se fosse um único momento, uma fotografia cinza, quente e cheirosa, com cheiro de manteiga. Na Padaria Santa Tereza, e em muitas outras do centro histórico, eu me sentia compartilhando uma tradição dos pequenos prazeres: a centenária necessidade de parar no meio do caminho.
A quadra onde moro e trabalho hoje em Brasília é desprovida de cafés e boas padarias, o que me tira algumas alegrias: sentar em uma mesinha minúscula, comprar um expresso superfaturado e fingir, por 10 minutos, que eu tenho todo o tempo do mundo; subitamente decidir que Eu Mereço um croissant de chocolate, sabendo que devo merecer bem mais; ter a sorte de ter um amigo para me despertar do transe com um “cafézinho?”. Quantas décadas terei de esperar para que essa tradição chegue aqui?