rafaela
1 min readOct 13, 2023

Quem busca faz duas viagens

Todo dia, às nove, quando saio pela rua Dr. Clementino em direção à estação de metrô, ainda sinto que poderia te avistar no horizonte, chegando. Caminhando em itálico com a bolsa pesada em uma das mãos. Porque eu nunca tive carro. Porque nunca tenho internet no meio da rua para saber se você está chegando ou se acaba de chegar. Porque nunca te busco nas horas certas.

Parecia impossível saber com antecedência o que você esperava de mim, apesar de óbvio. Hoje é óbvio para mim que eu nunca quis buscar ninguém, porque meus braços são fracos, como os seus. Porque quem busca faz duas viagens e eu estou sempre tão cansada.

Na espera, há pouco espaço para amar o que realmente existe e eu queria, sim, ser amada tanto quanto fosse possível. Todos nós queremos ser amados pelas exatas coisas que podemos oferecer, mas nem sempre acontece. Às vezes não há nada para dar além de solidão com vista pro mar. Outras vezes, nem isso.

Hoje as pessoas atrasam comigo e eu não digo nada. Marco sete para chegar sete e meia e fico nas catracas esperando até umas oito. É um alívio esperar, é um alívio ser a pessoa que perdoa porque é tão mais fácil do que eu imaginava.

Por isso, mais fácil seria nos encontrarmos no meio do caminho, em frente à padaria Dona Helena e eu te compro uma pequena torta de limão para compensar o meu desleixo. Por essas e outras, não te verei no horizonte tão cedo.