Não amar é uma forma de vencer. Aos olhos de quem ama, quem não ama tem vantagem, uma miserável vantagem.
“Miserável” pois vencer não é necessariamente bom — mas ainda vence, mesmo que infelizmente. Isso porque todo apaixonado é um perdedor se não o amam de volta. Agora, quem não ama não corre o risco de perder; pode sofrer ou até querer poder amar (para fazer do outro vencedor também), mas vence inevitavelmente aos olhos do mundo, aos olhos de quem narra a vida alheia. Vence porque quem não ama decide o destino de quem ama, é um tipo de juiz que também faz parte da partida.
É um injusto acúmulo de poderes, é um tirano, e mesmo que sinta algum tipo culpa, é impossível perder nesse jogo. Mesmo que finja amar, enganar ainda é vencer, é ter vantagem aos olhos de Deus ou da História.
Às vezes seria mais fácil amar (como escrever sobre não amar enquanto existe alguém que te ama?). Vencer é, por vezes, perder por dentro, lidar com o remorso de não amar quem merece ser amado e impedir o fluir de uma história feliz.
De fato, quem quer dançar não dança se o outro permanece sentado, o desejo é castrado por quem não deseja, o carinho não chega à noite se o outro dorme. Não permitir que as coisas aconteçam, vetar os caminhos, trancar as portas; não amar é dar a maior das palavras: a última.
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Comentários da autora
14/05/2024
Esse texto foi escrito no final de 2019 e resgatado dos meus rascunhos. Hoje, porém, acredito que amar é vencer (vencer o medo do desamor). Claramente o texto não é sobre amar ou não amar, mas sobre o ônus de ser a pessoa que termina um relacionado. Tentei abordar um pouco da angústia desse lado da relação, uma perspectiva diferente daquela mais difundida (da pessoa que levou um pé na bunda), com a intenção de gerar um novo tipo de empatia (por mim, obviamente). O pensamento que me invadiu para escrever esse texto na época (e, por algum motivo, ele não consta no texto) foi algo do tipo: enquanto eu pondero o fim, você inocentemente sonha com a continuidade de tudo isso; enquanto eu tomo todo o tempo que preciso para processar e decidir, você receberá a notícia de uma vez só. Quem decide dizer adeus, de fato, tem algum poder; por isso é preciso ser responsável, porque não há como vencer. Só há perdedores no desamor.
